Depois da EDP, da REN, da PT, da TAP, do frango assado e dos pastéis de
nata, parece que a última coisa que ainda é realmente nossa – e fazemos quase tão
bem como os melhores – estaria afinal para ser vendida também. E logo a única produção
nacional que o Dr. Passos Coelho tem feito crescer significativamente, sem que
o mérito lhe seja por todos devidamente reconhecido.
Logo agora que estava tão pimpona e se podia apresentar a estranhos sem ter
que pentear a guedelha negligente, parecia que vinha aí um Mário qualquer – italiano invejoso e amigo
do alheio – oferecer-se para comprar a dívida que, de tão nossa, até se chama “soberana”.
O último pedacinho de Portugal que nos resta, e do qual devíamos sentir
patriótico orgulho, poderia começar a desaparecer mediante a perversa troca por
outra dívida com juros mais fraquinhos e fabricados em Frankfurt. Pensei eu! Afinal, o senhor só queria oferecer a massa a quem melhor a tem sabido cozinhar, os nossos muito amados bancos, que tantas maravilhas têm operado por esse mundo fora. A nossa dívida, portanto, parece garantida por muitos e bons anos e promete tornar-se uma senhora de bom porte. E que os deuses a conservem.
Só estaria ameaçada, por hipótese absurda, se nos ocorresse eleger um governo “radical”, que quisesse
desfazer-se dela, ou de parte dela, assim sem mais nem menos, como os malucos
dos gregos. O radicalismo do governo Tsipras manifestou-se logo na tomada de posse.
Ainda antes de começar a dispensar a dívida, quase todo o governo grego dispensou
a gravata e a igreja, num prenúncio claro de que pretende desfazer-se de certos
nós e ortodoxias. Com tanto radicalismo, um dia destes ainda os apanham a comer
bifes de soja, a usar sacos recicláveis e a governar para os cidadãos em vez de
financiar os bancos.
A nossa sorte é haver sol e praias com areia suficiente para estender a
toalha, porque assim podemos continuar a dormir uma longa e reparadora sesta.
Portugal e a dívida |