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13 setembro, 2015

Política de preços baixos



As campanhas eleitorais são como as campanhas de promoções dos hipermercados. Se os hipermercados baixam os preços, como forma de levar as pessoas a entrar nas lojas e a gastar dinheiro em coisas de que não precisam, enquanto se abastecem do essencial; nas campanhas eleitorais os partidos embaratecem a conversa e baixam os custos das políticas futuras, de maneira a levar as pessoas a votar na fada dos dentes. Aquilo que antes poderia parecer coisa de sonhos improváveis, afigura-se de súbito realizável pela introdução de um papelinho numa ranhura, como dentinho caído que se introduz num recanto secreto para que a fada da especialidade no seu lugar deixe, sei lá, uma quantia correspondente à sobretaxa do IRS, que por abnegação deixámos cair do bolso, ou aquela parte dos salários e pensões que voluntariamente sacrificámos ao serviço da dívida.
   
Por isso é que não me meto em campanhas. Ou antes, não compro mais do que o indispensável. Nem aos hipermercados, nem aos partidos grandes, que são os verdadeiros hipermercados da política. Se aos primeiros vou apenas quando estritamente necessário, dos segundos espero tão pouco que já nem os panfletos deles uso na lareira, porque aquilo pega mal e liberta estranhos odores.

É claro que a maioria dos portugueses não pensa como eu. A julgar pelas sondagens, quase ninguém resiste a ideias em saldo. “Não conhecem outras”, diz o meu amigo Inácio. E é capaz de ter razão, porque mesmo quem lê jornais não acha lá mais variedade. As sondagens, que tenho visto pelo canto do olho, sugerem até que há cerca de um terço dos portugueses que sofrem de “síndrome de Estocolmo” e se preparam para abraçar quem os fez reféns de uma miséria que já parecia em vias de extinção. Digo “reféns” porque a dita “austeridade” é apenas o pretexto para amarrar o país a uma política de liberalização da economia que apenas vai acentuar o que nos foi vendido como consequência da crise. E dizem que isso é bom. Como o óleo de fígado de bacalhau e o arroz de atilhos?

Se há hoje mais pobres miseravelmente pobres; pobres que antes eram remediados; remediados que antes viviam com desafogo e – por contraponto meramente acidental e benigno, claro – ricos que estão hoje mais ricos, o que parece previsível é que os três primeiros grupos (essencialmente os que dependem de um salário), sejam cada vez mais entregues a si próprios e aos caprichos das lotarias financeiras, enquanto os quartos colherão os benefícios das desregulações dos mercados todos, abatendo à carga todo o lastro que os possa prender à terra, sobretudo coisas maçadoras como os “custos do trabalho”.  

Os portugueses inocentes foram convencidos de que tudo isto é inevitável e até benéfico. Se calhar porque se atreveram a respirar o ar que não lhes pertencia, pagam agora os juros do oxigénio emprestado. Reconhecidos, muitos acreditam que o ladrão lhes vai devolver a carteira. Os verdadeiros responsáveis só não choram a caminho dos bancos porque já lá estavam a beber champanhe, celebrando antecipadamente a colheita das contribuições que esperam roubar à segurança social. Quem não puder pagar, que se governe com menos.

Ainda pelas mesmas sondagens, há quantidade quase igual de portugueses que têm esperança de que o hipermercado do lado faça preço diferente e estão dispostos a consumir lá os próximos quatro anos. Não digam que fui eu a avisar, mas suspeito que a diferença está quase toda no rótulo e, quando muito, vão receber um brinde barato que não dura seis meses. 

Instantes

1   Diziam, pela calada agonia dos instantes que eram mudos.   Julgavam-nos pela constância infinita das lamentações pelo fôlego breve do pá...