As campanhas eleitorais são como as campanhas de
promoções dos hipermercados. Se os hipermercados baixam os preços, como forma
de levar as pessoas a entrar nas lojas e a gastar dinheiro em coisas de que não
precisam, enquanto se abastecem do essencial; nas campanhas eleitorais os
partidos embaratecem a conversa e baixam os custos das políticas futuras, de
maneira a levar as pessoas a votar na fada dos dentes. Aquilo que antes poderia
parecer coisa de sonhos improváveis, afigura-se de súbito realizável pela
introdução de um papelinho numa ranhura, como dentinho caído que se introduz
num recanto secreto para que a fada da especialidade no seu lugar deixe, sei
lá, uma quantia correspondente à sobretaxa do IRS, que por abnegação deixámos
cair do bolso, ou aquela parte dos salários e pensões que voluntariamente
sacrificámos ao serviço da dívida.
Por isso é que não me meto em campanhas. Ou antes, não
compro mais do que o indispensável. Nem aos hipermercados, nem aos partidos
grandes, que são os verdadeiros hipermercados da política. Se aos primeiros vou
apenas quando estritamente necessário, dos segundos espero tão pouco que já nem
os panfletos deles uso na lareira, porque aquilo pega mal e liberta estranhos
odores.
É claro que a maioria dos portugueses não pensa como eu. A
julgar pelas sondagens, quase ninguém resiste a ideias em saldo. “Não conhecem
outras”, diz o meu amigo Inácio. E é capaz de ter razão, porque mesmo quem lê
jornais não acha lá mais variedade. As sondagens, que tenho visto pelo canto do
olho, sugerem até que há cerca de um terço dos portugueses que sofrem de “síndrome
de Estocolmo” e se preparam para abraçar quem os fez reféns de uma miséria que
já parecia em vias de extinção. Digo “reféns” porque a dita “austeridade” é
apenas o pretexto para amarrar o país a uma política de liberalização da
economia que apenas vai acentuar o que nos foi vendido como consequência da
crise. E dizem que isso é bom. Como o óleo de fígado de bacalhau e o arroz de
atilhos?
Se há hoje mais pobres miseravelmente pobres; pobres que antes
eram remediados; remediados que antes viviam com desafogo e – por contraponto
meramente acidental e benigno, claro – ricos que estão hoje mais ricos, o que
parece previsível é que os três primeiros grupos (essencialmente os que
dependem de um salário), sejam cada vez mais entregues a si próprios e aos
caprichos das lotarias financeiras, enquanto os quartos colherão os benefícios
das desregulações dos mercados todos, abatendo à carga todo o lastro que os
possa prender à terra, sobretudo coisas maçadoras como os “custos do trabalho”.
Os portugueses inocentes foram convencidos de que tudo isto
é inevitável e até benéfico. Se calhar porque se atreveram a respirar o ar que
não lhes pertencia, pagam agora os juros do oxigénio emprestado. Reconhecidos, muitos
acreditam que o ladrão lhes vai devolver a carteira. Os verdadeiros
responsáveis só não choram a caminho dos bancos porque já lá estavam a beber
champanhe, celebrando antecipadamente a colheita das contribuições que esperam
roubar à segurança social. Quem não puder pagar, que se governe com menos.
Ainda pelas mesmas sondagens, há quantidade quase igual
de portugueses que têm esperança de que o hipermercado do lado faça preço
diferente e estão dispostos a consumir lá os próximos quatro anos. Não digam
que fui eu a avisar, mas suspeito que a diferença está quase toda no rótulo e,
quando muito, vão receber um brinde barato que não dura seis meses.