12 setembro, 2016

Filhos de Pandora

Liverpool

A esperança, Aurora
é o último dos males.
Não abras por isso
o coração.



Deixa correr primeiro
uma cortina até que o sol
caia no mar, vamos antes
acabar esta garrafa.
A esperança há de ser
a última gota.



É difícil dizer já é tarde
demais, está tudo fechado
é para sempre feriado
as ruas ficam eternamente a cheirar
à noite passada.



Mas não cantes mais não digas
mais nada, é só o mundo
que acaba, não abras
por tão pouco a porta de casa.



Guarda-te de gente
como eu, habitual
e obrigada, que sonha
de costas deitada no chão
e acende a luz com medo
de acordar o cão.  



A esperança é a última
a sair da festa, leva num saco
de plástico os restos do jantar
para jantar sozinha amanhã
e depois



e depois, quando já nada mais
puder acabar
em nenhum lugar
Aurora
o dia recomeça.

Arde

Mark Rothko, Number 14 (1960) Arde calma a culpa como a tarde cai.   Arde melhor o que não podes ver.   Por baixo da terra atos omiss...